Campeonato Português volta com aval de brasileiros e debate em torno do protocolo de saúde.
Nogueira, zagueiro do Gil Vicente. (Foto: Divulgação) |
Código de conduta exigido pela Direção Geral de Saúde gera dúvidas entre jogadores, aparadas somente após reunião entre capitães dos times, sindicato e Federação Portuguesa de Futebol (FPF).
A retomada do Campeonato Português na próxima quarta-feira, após quase três meses interrompido pela pandemia de Covid-19, conta com o aval dos jogadores brasileiros que atuam no país ouvidos pelo GloboEsporte.com nas últimas semanas.
Com 31,2 mil casos e apenas 1.356 mortes pelo coronavírus, Portugal foi um dos países da Europa Central menos atingidos pela doença.
O sucesso das medidas preventivas adotadas pelo governo é uma das razões para a confiança dos jogadores no retorno aos campos.
"A nossa realidade é um pouco diferente dos outros países europeus. Portugal está voltando na hora certa", afirmou Pedro Casagrande, zagueiro do Portimonense.
"Só que a gente tem que tomar todas as medidas preventivas possíveis, porque no Norte do país, onde estão os clubes que a gente vai enfrentar, é onde aconteceram mais casos. Fazer todos os testes é muito importante, para que ninguém seja contaminado", completou.
Parecer técnico acende alerta entre jogadores em Portugal: Apesar da confiança dos jogadores para a volta em Portugal, as semanas de preparação foram marcadas por uma controvérsia.
No dia 10 de maio, a Direção Geral de Saúde (DGS) divulgou o parecer técnico a ser seguido pela Federação Portuguesa de Futebol, Liga de Portugal (organizadora do campeonato), clubes e jogadores.
E logo os dois primeiros pontos acenderam um alerta.
Três dos nove jogadores brasileiros ouvidos na reportagem receberam as medidas com preocupação no início.
Dois deles pediram anonimato ao comentar a situação.
"Acho que isso é muito ruim, porque a gente vai estar botando a nossa saúde em risco e a saúde da nossa família. A gente vai voltar para casa e ter contato com nossos familiares. Então isso eu acho meio complicado", disse um deles.
"A DGS soltou um comunicado falando que os jogadores são os responsáveis se contraírem o vírus, mas alguns não gostaram disso e falaram que só voltarão se a DGS se responsabilizar", observou o outro.
O goleiro Lucas Paes, do Vitória de Setúbal, também demonstrou insatisfação inicial com esses pontos do parecer técnico.
"Não gostei da decisão, porque todos nós estamos sujeitos a ficar infectados, mesmo tomando todos os cuidados devidos, por isso não concordei. Mas não deram nenhum acordo para assinarmos por enquanto, disse ele.
Sindicato assina código de conduta pelos jogadores: Os três se manifestaram logo após a publicação do parecer, mas no fim das contas nenhum jogador da Liga de Portugal precisou assinar o código de conduta nem se responsabilizar por um eventual contágio.
Por causa da repercussão entre os atletas do país, uma reunião por vídeo-conferência foi convocada pelo Sindicato dos Jogadores Profissionais de Futebol de Portugal, com os capitães de todos os times e o ex-ministro da Saúde português Adalberto Campos Fernandes, representando a FPF e a Liga.
"Os jogadores interpretaram como uma vinculação de responsabilização, mas o que a DGS queria dizer não era que os jogadores seriam responsáveis pelo contágio, apenas que eles deveriam estar cientes do documento e que se responsabilizariam em seguir os protocolos de saúde recomendados", afirmou o presidente do Sindicato, Joaquim Evangelista.
"No final, ninguém precisou assinar nada, o próprio sindicato assinou o código de conduta em nome dos jogadores", completou.
Procurada, a FPF afirmou que a questão já estava superada entre os jogadores e que o parecer técnico "foi elaborado em sintonia com as autoridades de saúde e as associações de classe, jogadores, treinadores, árbitros e médicos".
Procurado novamente, um dos jogadores brasileiros que se incomodaram no início com o código de conduta confirmou que a polêmica, para ele, estava resolvida:
"Eles vão dar um documento de responsabilidade. Muito legal isso da parte deles, podemos voltar com total segurança, sem preocupação nenhuma", declarou.
Este compromisso é subscrito, sob a forma de um Código de Conduta assinado, entre todos os agentes desportivos e as estruturas competentes da FPF e Liga Portugal, e outras que sejam consideradas necessárias.
A FPF, a Liga Portugal, os clubes participantes na Liga NOS e os atletas assumem, em todas as fases das competições e treinos, o risco existente de infeção por SARS-CoV-2 e de COVID-19, bem como a responsabilidade de todas as eventuais consequências clínicas da doença e do risco para a Saúde Pública.
Entre as 14 medidas do parecer técnico da DGS, uma trata especificamente da proibição de público dentro e nos arredores do estádio: "Nenhuma competição pode ocorrer com público no interior dos estádios, até ao final da temporada.
No exterior e imediações dos estádios, a circulação de pessoas deve ser limitada e condicionada, não estando autorizada a concentração de pessoas em número superior a 10".
A maioria dos outros pontos diz respeito às regras sanitárias e de distanciamento necessárias para evitar o contágio do coronavírus, que precisam ser seguidas por jogadores e também pelos clubes, FPF e Liga, como por exemplo:
Atletas, equipes técnicas e árbitros devem manter-se em recolhimento domiciliar desde a volta dos treinos para as competições oficiais e até o final da temporada de todas as competições.
Os deslocamentos devem restringir-se ao trajeto domicílio-clube/competição-domicílio.
Apenas são permitidos contatos sociais com coabitantes e os membros do clube estritamente necessários para a prática desportiva.
Os membros do clube, que devem ser reduzidos ao mínimo indispensável, os coabitantes dos atletas, equipes técnicas e árbitros ficam igualmente obrigados ao dever de recolhimento domiciliar imposto aos atletas.
Os clubes devem ajudar os atletas e as suas famílias a evitar deslocamentos, recorrendo a entregas domiciliárias de bens e serviços.
Qualquer pessoa que durante a temporada desenvolva sintomas sugestivos de Covid-19 deve ser isolada e testada.
A FPF, a Liga Portugal e os clubes devem implementar uma estratégia de testes aos atletas, equipes técnicas, árbitros e demais intervenientes que permita a identificação precoce de casos positivos para o SARS-CoV-2 (que embora assintomáticos podem ser transmissores do vírus), promovendo o seu isolamento para uma rápida interrupção de cadeias de transmissão.
Controvérsia à parte, todos os brasileiros ouvidos pela reportagem, mesmo os que questionaram inicialmente o código de conduta, aprovam a data de retorno do Campeonato Português.
Outros jogadores foram procurados, mas preferiram não dar opinião ou alegaram veto dos seus clubes para entrevistas.
"A melhor coisa era voltar, até porque não é só o futebol, as pessoas já voltaram a trabalhar, então a data é a melhor possível", disse um dos jogadores que pediram anonimato.
"A questão da pandemia aqui está bem melhor, os casos abaixaram, mas se voltar como antes seria melhor parar de novo porque a vida vem em primeiro lugar do que o futebol", completou ele.
"Eu acho muito bacana a gente poder voltar a trabalhar, poder fazer o que escolhemos. Eu estou muito feliz em saber que o campeonato vai ser retomado, e que eu vou poder terminar a temporada, com fé em Deus", afirmou o outro jogador não identificado.
Já Lucas Paes destacou a necessidade dos cuidados de prevenção para evitar contágios:
"Achei meio estranho todas as competições de futebol e outras modalidades acabarem e só a Primeira Liga (Campeonato Português) que não, mas agora que decidiram terminar a competição acho que tem que acabar mesmo. Claro, com todas as condições necessárias para acabar sem nenhum risco aos atletas, comissões e funcionários".
Confira outras opiniões sobre o retorno do Campeonato Português:
DOUGLAS TANQUE, atacante do Paços de Ferreira:
"Portugal soube se preparar e se prevenir. Autoridades e população sempre jogaram juntas e souberam controlar bem essa pandemia. Se definiram a volta para o dia 3, é porque estão bem embasados, confiantes na segurança e na saúde dos jogadores e de todos os envolvidos para que esse retorno aconteça da melhor maneira. Sou a favor por esse motivo, pelas coisas estarem sendo feitas de forma clara".
EDUARDO KAU, zagueiro do Belenenses:
"Se todos os cuidados forem tomados para realização de jogos e treinos sou de acordo com a volta. Como atleta fico feliz pela competição voltar e podermos terminar os dez jogos que faltam. Nenhum atleta de futebol gosta de ficar em casa longe do contato com a bola e dos companheiros de equipe, pois sempre foi uma rotina diária e quando tudo muda do nada sentimos falta. Mas pensando como um ser humano é estranho voltarmos à nossa vida normal de treinos e jogos enquanto muitas pessoas do mundo todo continuam morrendo e passando por dificuldades que esse vírus causou".
NOGUEIRA, zagueiro do Gil Vicente:
"Esse fato só está sendo possível devido às rápidas medidas aplicadas pelo governo e ao comportamento da população no período. Se há algo que merece ser saudado neste momento é a disciplina do povo português no cumprimento das recomendações de isolamento social. Portugal voltará a ter futebol e o seu povo contribuiu diretamente pra isso. A notícia foi recebida por nós, atletas, com enorme alegria".
CRYSAN, atacante do Santa Clara:
"É uma sensação muito boa (a confirmação do retorno do campeonato). Nós atletas sempre queremos estar dentro de campo, mesmo sabemos que nesse período de pandemia é complicado falar em felicidade ou satisfação. No entanto, é muito bom o término da competição ser no campo".
MATHEUS REIS, lateral do Rio Ave:
"Ficamos quase 50 dias de quarentena. Na minha carreira não me lembro de ter ficado tanto tempo sem jogar. Particularmente não via a hora de retornar a fazer o que eu amo, de sentir o gramado e o prazer que é de jogar futebol. Acredito que o Rio Ave esteja seguindo todas as medidas possíveis para manter o mínimo de contato possível e que os jogadores e funcionários estejam sempre protegidos. O clube está passando uma sensação de segurança nessa volta".
Reportagem: Globoesporte.globo.com
Adaptação: Eduardo Oliveira
Revisão de Texto: Ana Cristina Ribeiro
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