A fé que move uma equipe no interior de São Paulo.
Em demonstração de tolerância e devoção, católicos e evangélicos formam time de Aparecida de Monte Alto, criado em homenagem a Nossa Senhora da Conceição Montesina.
Futebol e religião são quase sinônimos.
Às vezes de forma mais profunda, outras vezes de maneira mais superficial, mas é inegável que onde há uma bola rolando, há alguém fazendo uma reverência à sua religião, à sua devoção, seja nos gramados ou nas arquibancadas.
Fato que não seria diferente no futsal, onde uma equipe no interior de São Paulo é envolta nessa fé e faz do seu dia a dia quase uma extensão do “Santuário de Nossa Senhora da Conceição Montesina”, localizado no distrito de Aparecida de Monte Alto, pertencente ao município de Monte Alto, na região de Ribeirão Preto (330 km da capital, São Paulo).
Em uma competição oficial pela primeira vez em sua história, o time de Aparecida de Monte Alto disputa a Taça EPTV de Futsal da região de Ribeirão Preto, tradicional campeonato da modalidade no interior de São Paulo, que está na sua trigésima sexta edição.
A ideia de vincular a fé com o futsal partiu de um grupo de amigos.
Um dos maiores incentivadores do atual projeto é Diomedes Oliveira, diretor do time de Aparecida.
"Tudo surgiu em uma conversa com o presidente do clube (Campestre), que é apaixonado pelo futsal e apoia o esporte. Tivemos essa conversa e sabíamos que seria um marco histórico para o distrito, agregar a questão religiosa e deixar como a marca da equipe", explicou Oliveira.
Por conta da devoção de grande parte do povo de Aparecida, não foi difícil achar jogadores animados com o novo time.
Caso do goleiro João Paulo dos Santos, de 37 anos, mais conhecido como “Nego”.
"Estamos fazendo história. Estamos entrando na história da cidade, do distrito e da Virgem Montesina e isso é um orgulho tremendo. Temos a oportunidade de entrar lá (quadra) e honrar esse manto da Virgem e os povoados de Aparecida que torcem pela gente", celebrou o arqueiro.
Fé que vem de berço: Para deixar claro aos adversários o motivo da existência da equipe de Aparecida, a mascote do time é própria santa, que estampa inclusive o uniforme do elenco.
Fato que faz os jogadores mais devotos terem uma motivação a mais ao defender as cores de Montesina.
"A nossa fé em Deus é de infância. Está em mim desde o dia em que eu nasci. Minha família é muito católica e desde que me conheço por gente eu ia com minha mãe para a igreja, junto com meus irmãos. De lá pra cá, a gente vem aprendendo a amar Nossa Senhora Aparecida e a Virgem Montesina cada dia mais", afirmou João Paulo.
O goleiro sempre foi praticante da religião católica, participou do grupo de jovens, foi catequista, chegou inclusive a fazer a liturgia durante as missas e mesmo hoje não estando presente no dia a dia da igreja como antigamente, ele segue com a fé inabalável.
"A Virgem de Montesina é a nossa mãe e sempre pedimos interseção, fazemos nossos pedidos e agradecimentos desde a hora em que acordamos. Agradecendo sempre por estar aqui mais um dia, podendo celebrar junto aos amigos e a família".
Respeito e tolerância: A religião católica é o lema da equipe, mas isso não significa que todos os jogadores são católicos ou praticantes do catolicismo.
O espaço é aberto aos atletas de todas as religiões, sempre pregando o respeito e o direito de exercer a fé escolhida por cada uma.
"Eu praticamente cresci na igreja Evangélica, por conta da minha família por parte de mãe, mas sempre tive amigos e familiares católicos ao meu redor. Então, felizmente, eu nunca me deixei ser influenciado por intolerância religiosa, seja qual for à religião", citou o ala Denis Pereira da Silva, evangélico, de 22 anos.
Mesmo o time sendo predominantemente católico, Denis não pensou duas vezes quando surgiu a oportunidade de defender a equipe de Aparecida de Monte Alto.
"Jogo futsal e futebol desde criança e sempre estive em contato com rezas católicas. Quando surgiu a chance de representar o distrito, não pensei pelo lado religioso em nenhum momento", declarou.
Ele, inclusive, diz que sempre se sentiu muito respeitado pelos companheiros de time.
"Sempre fui respeitado por todos e nunca ninguém fez brincadeiras com a minha religião e eu do mesmo jeito. Cada um tem suas crenças, mas o respeito sempre foi o mesmo".
"O respeito é mutuo e tem que vir do ser humano. Independente de cada religião e de suas diferenças na busca pela fé, sempre buscamos o mesmo Deus. O respeito tem de vir do ser humano", lembrou o goleiro João Paulo.
Denis ainda mandou um recado para quem um dia pensa em praticar algum ato de intolerância devido às diferenças religiosas.
"Peço mais amor e respeito. Intolerância religiosa não cabe mais no mundo em que vivemos. A gente não precisa concordar com A ou B, a gente apenas tem que respeitar. Através do respeito todos ganham, no esporte e na vida", completou.
Turismo Religioso: Aparecida tem o turismo religioso como principal atividade econômica, fato que passa pelo Santuário de Montesina, uma igreja construída há quase 174 anos.
Conta a história, que em 8 de dezembro de 1848, foi celebrada a primeira missa no atual santuário, quando ainda era uma capela, construída pelo dono de uma fazenda após receber um milagre de cura.
Ao longo do tempo, a igreja já teve a imagem da santa Montesina roubada, sofreu um grande incêndio em 1898 e passou por algumas reconstruções e reformas.
O atual formato do Santuário teve sua obra iniciada em 1929 e mesmo estando aberto para atividades religiosas desde 1952, segue em obras para sua finalização.
"O santuário é o chamativo do distrito e tudo gira em torno dele. É uma igreja que começou ser construída há muito tempo e ainda está em obras. Aparecida é um lugar muito bonito, com um povo muito acolhedor e o nosso chamativo é a fé e a igreja", elogiou Diomedes Oliveira.
O dia de Santa Montesina é celebrado em 8 de agosto, quando há uma peregrinação de Monte Alto até o distrito, distante 20 quilômetros do Santuário.
Segundo dados da Secretaria de Turismo de Monte Alto, cerca de cinco mil romeiros percorreram o caminho no ano passado.
"Na fé, já somos campeões", finalizou o diretor da equipe.
Reportagem: Globoesporte.globo.com
Adaptação: Eduardo Oliveira
Revisão de Texto: Ana Cristina Ribeiro
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